sexta-feira, 22 de outubro de 2010

LIBERDADE DE EXPRESSÃO X DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA




Olá pessoas que não leem este blog! Não sei se vocês tiveram a oportunidade de acompanhar, mas a Bienal deste ano parece estar ótima para gerar discussões! Urubus engaiolados e estímulo ao crime são apenas algumas das atrações...Mas o que mais chama a anteção, são as críticas feitas ao presidente da OAB pela suposta "censura" deste às obras do artista Gil Vicente, o qual por meio de suas obras tem mostrado verdadeira apologia ao crime.
No período da ditadura militar, por meio do Ato Institucional n°5, quase todas as formas de expressão foram censuradas e muitos artistas exilados. Um bom exemplo é a canção “Para não dizer que eu não falei das flores, de Geraldo Vandré, a qual foi proibida durante anos e seu autor exilado. Foi uma época em que não só a censura à liberdade de expressão, mas também à liberdade de reunião, à liberdade de convicção política e filosófica e à vários outros direitos fundamentais. Após a queda do regime militar e a promulgação da Constituição Federal de 1988, a censura chega ao fim. Mas será que chega mesmo?! Atualmente, alguns casos estão trazendo a tona o assunto, principalmente no que tange ao principio da liberdade de expressão.

Na Bienal de arte realizada em São Paulo, o artista Gil Vicente está sendo alvo de incessantes críticas por conta de sua obra intitulada “Inimigos”,a qual retrata personalidades como o papa, a rainha Elisabeth, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e até o atual presidente do Brasil sendo ameaçados de morte. Para o presidente da OAB São Paulo, Luiz Flávio Borges D´Urso, tais obras revelam desprezo pelas figuras humanas retratadas, além de desrespeito para com as instituições que tais figuras representam e ainda desprezo pelo poder por elas instituído. Por todos os motivos elencados, a OAB decidiu por oficiar o Ministério Público para que este tome providências a fim de retirar as obras da exposição. Diante da posição da OAB frente ao fato citado surge o dilema sobre qual direito fundamental deve prevalecer: o direito a liberdade de expressão [art.5°,IX ,CF] ou a dignidade da pessoa humana [art.5°,III,CF] ?

Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino em seu livro sobre Direito Constitucional afirmam que não há hierarquia entre direitos fundamentais, entretanto, quando houver o conflito, o interprete deverá usar o critério da ponderação de valores, ou seja, deve tentar harmonizar os bens jurídicos em conflito de forma que um deles não prevaleça em detrimento do outro. Tal ponderação deve ser feita com base na análise do caso concreto, na razoabilidade, visando sempre a máxima proteção e a concretização dos direitos fundamentais .

A Carta Magna em seu artigo 5°, inciso IX dispões que “É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença” e ainda o parágrafo 2° do artigo 220 assevera que “É vedada qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”Os dispositivos citados nos permitem entender que desde a promulgação da atual constituição, a liberdade de arte não pode sofrer censura, porém, quando em conflito com a dignidade da pessoa humana, garantida pelo inciso III do artigo 1° do mesmo diploma legal, deve ser cuidadosamente analisada.

É notório ser direito do autor criar e expressa seu pensamento através de sua arte, mas devem haver valorações e ponderações em relação à sua exposição ao público se tal obra afronta a paz social, os princípios do Estado Democrático de Direito e a própria democracia. Não seria correto o diretor de um filme colocar cenas de sexo explicito em um filme infantil ou uma peça de teatro com sátiras a uma determinada religião. No caso em tela, a afronta se dá para com figuras públicas [e indiretamente com as instituições por elas representadas]. Basta a análise do art.5°, XLI da Carta Maior: “A lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”. Ou seja, ainda que o autor Gil Vicente esteja gozando de seu direito fundamental de liberdade de expressão, está fazendo de forma a afrontar o direito fundamental à honra e imagem das pessoas e ainda a um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, que é a dignidade da pessoa humana, caindo então no disposto no art.5°, XLI, CF.

É evidente que a liberdade de expressão deve ser amplamente defendida, não só pelo povo mas pelos órgãos institucionais pois é uma conquista inegociável da nação brasileira. Todavia, não se pode usufruir desta conquista com a ausência dos limites legais e principalmente, do bom senso. Como afirma Luis D´Urso: “Não se pode sob o manto da obra de arte colocar-se acima da lei.”.
Para finalizar, é de grande valia citar o artigo 1° da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789:

“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos, dotados de razão e de consciência e devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”

E ainda nas palavras de Rui Barbosa:

“Velar pela Constituição não é somente fazer leis que estabeleçam a repressão daqueles que as infringem, é muitas vezes clamar pela verdadeira interpretação constitucional, estabelecendo a boa jurisprudência, firmando precedentes para o futuro.”


DIXI!